No texto da semana passada apresentei a vocês o que é a de Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). Então você deve se lembrar de que essa abordagem é baseada em evidências e que parte do pressuposto de que não são os acontecimentos que definem as formas de agir, de pensar e de sentir do ser humano, e sim como ele os interpreta.
Apresentei também que o tratamento está fundamentado em uma conceituação, ou compreensão, de cada paciente (suas crenças específicas e padrões de comportamento) e que a função do terapeuta é procurar produzir, de várias formas, uma mudança/flexibilização cognitiva.
Além disso, a TCC exige uma análise detalhada do comportamento, da cognição e das emoções do paciente, além de considerar ser fundamental uma determinação precisa dos objetivos do tratamento, permitindo suposições sobre alterações neuroanatômicas e processos funcionais que ocorrem durante uma atividade em particular do cérebro. Ou seja, a TCC tem tudo a ver com o entendimento do funcionamento do nosso cérebro. Por isso, hoje, vamos falar sobre as contribuições das Neurociências para a Terapia Cognitivo-Comportamental.
As características da TCC a aproxima tanto do campo das Neurociências que pode orientar as pesquisas para a busca de evidências de correlatos neurobiológicos das mudanças observadas após o tratamento Cognitivo-Comportamental. Não à toa, o número de estudos empíricos sobre a eficácia da TCC, mensurada por meio de alterações neurobiológicas, está aumentando constantemente.
Mas, então, o que é Neurociência?
Podemos conceituar Neurociência como a área que busca estudar o sistema nervoso, visando desvendar seu funcionamento, estrutura, desenvolvimento e eventuais alterações que sofra. Já podemos compreender que o objeto de estudo dessa ciência é complexo, sendo constituído por três elementos: o cérebro, a medula espinhal e os nervos periféricos.
A Neurociência, com uma abordagem integrativa e multidisciplinar, surgiu no final dos anos de 1970 pela necessidade de convergir contribuições de diversas áreas da pesquisa científica e clínicas para compreensão do funcionamento do sistema nervoso de forma completa.
Os métodos de investigação mais comuns na Neurociência contemporânea são constituídos por meio de técnicas que possibilitam o estudo morfológico, funcional, preciso, objetivo e replicável do sistema nervoso central (SNC), periférico (SNP) e autônomo (SNA). Alguns ramos da Neurociência estão mais relacionados à TCC, como a Neurociência comportamental, a Neurociência cognitiva, a Neurociência do desenvolvimento e a Neurociência social.
Como aplicar a Neurociência na clínica?
Em relação às aplicações dentro do ambiente clínico, a Neurociência visa a identificação dos mecanismos patogênicos etiológicos de doenças neurológicas e transtornos mentais e o desenvolvimento de novas metodologias para o diagnóstico e o tratamento do sofrimento psíquico.
Na Neurociência, a disciplina que liga o laboratório e o setting terapêutico é conhecida como psicofisiologia clínica. Essa disciplina envolve métodos e procedimentos que constituem um sistema de interface entre o cérebro, o processamento mental e seu contexto relacional. Lida com a implementação de metodologias de análise objetiva do funcionamento do sistema nervoso central e do funcionamento neurovegetativo e autônomo. Uma das tecnologias que hoje está mais facilmente disponível é o eletroencefalograma (EEG).
A Neurociência e o comportamento aprendido
Um ponto importante abordado na TCC é o fato de que todos nós aprendemos continuamente ao longo de nossas vidas. Tanto o comportamento funcional quanto o disfuncional é aprendido. Sendo assim, podemos concluir que todo comportamento disfuncional que é aprendido pode ser extinto e substituído por outro mais funcional. A TCC ajuda os pacientes a aprender e adotar novos conhecimentos e habilidades, o que lhes permitirá observar e mudar os seus próprios pensamentos, comportamentos e estados emocionais.
E onde entra o nosso cérebro nessa história? O nosso cérebro é caracterizado por neuroplasticidade – uma propriedade fundamental, complexa e multifacetada – que o faz ser adaptável às mudanças nas condições ambientais e internas. É um recurso que possibilita modificar, compensar, gerar e ajustar as funções neurais fundamentais à vida, como o aprendizado e a memória. As conexões individuais dentro do cérebro estão constantemente sendo removidas ou recriadas, dependendo, em grande parte, da forma como são usadas.
Uma das maneiras de o cérebro modificar-se por meio da neuroplasticidade é pela criação de interconexões entre os neurônios com base em seu disparo simultâneo durante um período de tempo. A Neurociência tem demonstrado que um comportamento pode ser aprendido e aperfeiçoado pela experiência, promovendo a formação de novos circuitos neurais e novas memórias, que podem ser acessadas em ocasiões futuras. Bingo! Estamos diante da grande relação da TCC com a Neurociência, já que nessa abordagem o terapeuta procura, junto ao paciente, produzir, de várias formas, uma mudança/flexibilização cognitiva no paciente, de modo que possa viver de uma forma mais “saudável”, não repetindo padrões indesejáveis.
A pesquisa interdisciplinar no campo da Neurociência tem se expandido ao conhecimento sobre correlatos neurobiológicos dos processos mentais e sobre as mudanças que ocorrem no cérebro devido a intervenções terapêuticas. Os estudos baseiam-se principalmente em técnicas de neuroimagem, como a ressonância magnética funcional (RMF).
A TCC considera a influência da aprendizagem para a construção de padrões disfuncionais de comportamento. Também propõe que as mudanças a partir das intervenções terapêuticas ocorrem a partir de aprendizagem.
Vamos simplificar: quanto mais algum tipo de comportamento é utilizado, mais alterações na anatomia e funções do cérebro podem ocorrer, aumentando, assim, a probabilidade de o mesmo comportamento ser utilizado novamente. Ou seja, se uma estrutura anatômica cerebral é cada vez mais recrutada em algum tipo de comportamento, não haverá competição para o espaço cortical disponível, que será ocupado pela função mais frequentemente utilizada.
O conhecimento estrutural e funcional do cérebro
Os últimos anos foram marcados por estudos neurocientíficos revolucionários sobre o funcionamento cerebral, que permitiram uma melhor compreensão dos processos e funções do cérebro, da psicopatologia, de mecanismos e estratégias de tratamento. As técnicas de neuroimagem estruturais e funcionais permitem o conhecimento mais minucioso, embora ainda inicial, de como a TCC tem o potencial de modificar circuitos neurais disfuncionais associados aos transtornos psiquiátricos e sofrimentos emocionais.
O intercâmbio da TCC com a Neurociência é o diálogo entre mente e cérebro. Podemos considerar que mente e cérebro são integrados e interdependentes. As pesquisas em Neurociências colaboraram, então, para potencializar nosso conhecimento sobre as bases neurobiológicas das psicopatologias e da TCC, assim como em auxiliar no refinamento de intervenções, revelar os circuitos neurais associados à melhora dos sintomas em decorrência do tratamento bem sucedido com a Terapia Cognitivo-Comportamental a fim de aumentar a eficácia do tratamento.
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